O MEC vendeu o sofá
A formação inicial docente presencial de baixa qualidade seguirá sem sofrer qualquer constrangimento do MEC, enquanto que a melhor formação docente a distância que o país tem a oferecer será negativamente afetada.
Com a recente decisão de obrigar cursos a distância de licenciatura e pedagogia a dedicarem 50% de sua carga horária a atividades presenciais, o MEC se assemelha ao sujeito da conhecida anedota que, após alertado por amigos, acreditou ter encontrado a medida preventiva mais eficaz para impedir a infidelidade da sua esposa: vendeu o sofá.
Que relação existe entre qualidade de formação e modalidade de ensino?
Perto de 100 anos de pesquisa em Educação vêm comprovando, ano após ano, pesquisa após pesquisa, em diferentes níveis de ensino, em diversos tipos de curso, de diferentes especialidades, em dezenas de países, com os mais diversos públicos, de todas as idades: NÃO HÁ DIFERENÇA SIGNIFICATIVA ENTRE APRENDIZAGEM A DISTÂNCIA E PRESENCIAL.
Para a qualidade do ensino e da aprendizagem, mostra a pesquisa científica em Educação, não importa se o curso é 10, 50 ou 100% a distância.
A modalidade não interfere com a qualidade, é o que aprendemos com a Ciência. Por isso temos tantos cursos presenciais de baixa qualidade, e cursos a distância de alta qualidade, alguns deles de excelência.
Somente um terraplanismo educacional mequetrefe justificaria a obrigatoriedade de 50% de atividades presenciais em cursos ditos a distância, porque, tecnicamente, os cursos de licenciatura e pedagogia oferecidos no país são semipresenciais, ou, para usar a palavra do momento, “híbridos”: todos envolvem centenas de horas de estágio presencial em escolas. Nenhum desses cursos é 100% a distância.
A decisão do MEC deixa intocados os cursos de licenciatura e pedagogia presenciais de baixa qualidade. Neles a carga horária é 100% presencial e a qualidade é ruim. Eles poderão continuar formando professores sem serem incomodados pelo MEC.
Mas essa desastrada decisão afeta negativamente os bons, ótimos e mesmo excelentes cursos a distância oferecidos muito especialmente pelas IES públicas, como a Univesp e as consorciadas do sistema Universidade Aberta do Brasil, coordenados pela Diretoria de EaD da Capes do próprio MEC.
Como consequência dessa medida terraplanista, esses cursos formarão cada vez menos docentes, e centenas de seus polos presenciais serão fechados por falta de alunos.
A formação inicial docente presencial de baixa qualidade seguirá sem sofrer qualquer constrangimento do MEC, enquanto que a melhor formação docente a distância que o país tem a oferecer será negativamente afetada.
É preocupante que a atual composição do Conselho Nacional de Educação tenha sido capaz de cometer esse ato.
E é igualmente preocupante que um Ministro da Educação tome uma decisão dessas. Se não ouviu os alertas da Associação Brasileira de Educação a Distância, poderia ao menos ter conversado com o povo da EaD da Capes…
Mas, nenhum gestor é eterno no cargo que ocupa. Mais um pouco e o CNE se renova, outro ministro assume o MEC. E aí quem sabe o país possa contar com gente que toma decisões cientificamente informadas e bem fundamentadas.
E o MEC pare assim de coar o mosquito para engolir o camelo. Ou de jogar fora a criança junto com a água do banho…